Abaixo trago três poemas do livro a ser lançado em 2012, em parceria com a poeta Maria Angélica Miranda, ainda sem título.
enfio os cinco dedos na terra
como quem quisesse dizer: aqui
jaz um monte de sementes de mim.
brinco de não ter amigos,
a arte é tudo que me resta.
nasci tela em branco,
nasci puro.
fui manchando aos poucos.
-----
espaço no corpo.
é preciso,
mais que tudo,
dar espaço no corpo.
a alma não pode deitar-se
confortavelmente,
sem que se abra
espaço.
como órgãos, ocupa-se
quase todo o corpo:
se houver carne,
deus aqui
não cabe.
-----
rixa.
queria ter nascido mulher
só pra poder ter tido um filho.
queria ter deixado sementes,
amansado aos cantos,
parindo,
assistindo tv aos domingos
dizendo
baixo e calmo: vem cá.
queria brincar com a tesoura
empunhada à barriga,
gritando
e correndo aos arredores da casa:
não me encosta que eu furo!
manchando
até os porta-retratos
com minha constante irritação,
borrando
seus cantos com um bolor
de terreno e maisena
arfando
para que todos os lugares
pelos quais já passamos sumam.
acordar meio fêmea.
acordei meio louco.
acordei pouco.